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ções do Decreto de 3 do corrente! Oh prazer! Oh gloria! Oh gratidão! Uma Assembléa Legislativa no Brasil! Um Principe offerecendo a vida a bem da nação! Ah! Senhores! Eu não tenho expressões que assaz manifestem meus sentimentos !... Ministros infames da intriga, fugi, fugi espavoridos !... Frustraram-se vossos sinistros e horrorosos inventos!

Patria minha! Alça majestosa frente! Extende generosos braços a nossos irmãos! Consolida o grande negocio da união! Conheça o mundo que portuguez e brasileiro devem ser synonymos. Si duas mil leguas de oceano dividem suas patrias, sagrados direitos de amizade fraternal estreitem e liguem seus corações heroicos. E' sem duvida desta união mysteriosa que deve nascer a honra nacional; é desta união, nunca interrompida, que deve emanar o bem a todos nós e a nossos filhos: são estes laços politicos que desfazem os planos de avidos e orgulhosos extrangeiros que sobre as cinzas da nossa ruina geral tentaram edificar os alicerces de suas prosperidades (1).

Pezemos, pois, honrados Cidadãos, a importancia de semelhante beneficio, do qual pendia a sorte de nossa patria. Nossos direitos garantidos, uma lei justa e regulada, segurança pessoal, igualdade politica, punição para o crime, premio para a virtude: eis aqui a torrente de venturas que esperamos. Já podemos lançar os braços aos nossos queridos filhos sem susto de que venham a ser victimas do capricho e da ambição desses monstros, cuja memoria será sempre odiosa á mais remota posteridade, pois elles já crescem na época brilhante da liberdade brasileira.

Compatriotas! Seremos insensiveis aos altos beneficios com que nos enriquece o nosso amado Regente? Não é possivel ... Marchemos, pois, conformes na estrada da honra e da fidelidade; soltem-se os diques do nosso enthusiasmo e do nosso reconheci

mento.

Principe Augusto! Si eu tivesse aquella eloquencia que tantas vezes, trovejando nas tribunas de Roma, salvou a patria das mãos de impios parricidas, Vós conhecerieis, Senbor, qual a minha ternura, minha fidelidade e minha gratidão...Mas si esta me foi negada não me resta mais sinão protestar perante Vossa Effigie, perante esta Assembléa, perante a Nação, perante a Terra e os Céos. que emquanto circular em minhas veias a ultima

(1) Estas allusões estão um tanto obscuras e podem se referir tanto ás Cortes de Lisboa, que tentavam recolonizar o Brasil, como aos extrangeiros bernardistas do governo de 8. Paulo, que expulsaram delle os paulistas e se fizeram exclusivos senhores da administração da provincia, provocando a reação dos municipios do interior.

(N. da R.)

gotta do meu sangue, ella se derramará sempre por Vós, Senhor, o melhor de todos os Principes, o precioso penhor da nossa gloria, o poderoso sustentaculo da liberdade brazileira.

Assim o juro! >>

Com tal energia e enthusiasmo foi recitado este discurso que, findo elle, sentiu-se electrizada a assembléa, que gritou a um tempo: «todos juramos», concluindo com repetidos vivas ao salvador da liberdade do Brasil e, finalmente, com • Нутпо Paulistano, sendo uma scena tocante ver as expressões de amôr e gratidão que em todos os semblantes transluziam.

Seguiu-se logo a mesa de doce e antes de principiar-se pediu o reverendo ecclesiastico padre Pedro da Annunciação Xavier licença ao presidente para proferir um bem trabalhado discurso, analogo aos acontecimentos politicos do tempo, desempenhando-o com toda a força. A' noite bellissima illuminação deixava ver os retratos de Sua Majestade e de Sua Alteza Real, a quem saudaram muitos, entre os quaes alguns reverendos ecclesiasticos, com obras poeticas, a que sempre respondia a musica com peças proprias, preenchendo-se o tempo com outros concertos harmoniosos e entretendo-se a companhia, ora assistindo, ora applaudindo das janellas aos instrumentos da banda do Regimento, que na rua, entre innumero povo, tocava o hymno, geralmente acompanhado.

Toda a casa tinha, dentro e fóra, geral e vistosa illuminação, illuminando-se tambem, espontaneamente, a casa da Camara e muitas outras da villa.

Terminou-se tudo quasi á meia-noite com esplendido chá, sendo notavel em toda à funcção a profuzão e a magnificencia. Assistiram á primeira mesa mais de sessenta cidadãos e depois muitos outros e por fim numerosa pobreza, de proposito convidada, havendo ainda muitas sobras que todas se repartiram e mandaram a pobres e dando-se de mais a mais, individualmente, esmolas pecuniarias, e até lançando-se das janellas da sala de doces grandes porções delle á plebe na rua, e reinando sempre a maior moderação.

Concorreram á mesa todas as auctoridades, tão conhecidas por seu franco patriotismo. Nesta reunião appareceu de sobra o fogo do liberalismo deste honrado povo, cuja grande paixão é «ODIO AOS DESASTROSOS FACTOS DA CAPITAL (1) e, por conse

extran

(1 Refere-se ainda á Bernarda de Francisco Ignacio, que, ligado a varios geiros, expulsou do governo Martica Francisco e o brigadeiro Jordão, genuinos paulistas, e se enthronizou com elles no poder em São Paulo.

(N. da R.)

guinte «ARDENTE AMOR Á LIBERDADE DO BRASIL e ao nosso amabilissimo Regente». Tal é tambem o espirito publico das mais villas da comarca, muitas dos quaes já tem participado officialmente identidade de sentimentos e de conducta e seu desempenho a todo o custo; tal é, não menor, o espirito geral da provincia nas outras suas comarcas, e si nem todas as suas camaras têm officialmente annunciado taes sentimentos é porque estão

ABAFADAS PELO SYSTEMA DC TERRORISMO ENTHRONIZADO E DOMÍ

NANTE NA CAPITAL, consolando-se os seus honrados cidadãos em gemer em silencio, á espera do seu idolatrado libertador, e em applaudir os esforços dos seus impavidos irmãos da comarca de Ytú.

Nem outra cousa mais se podia esperar dos descendentes de um Amador Bueno e de mil outros heróes que tanta gloria deram ao nome paulistano.

FIM.

Oeynhausen

No segundo dos seus interessantes artigos sobre o senado do Imperio, escreveu o Estandarte Catholico, em sua edição de 1

do corrente :

<«< Entre os senadores do Ceará citaremos o marquez de Ara«caty, Oyenhausen Gravenburg, cuja fidelidade inabalavel á « pessoa de D. Pedro I levou-o a resignar a sua curul, afim de acompanhar o monarcha ao exilio, e celebre como capitão general de varias partes do Brasil. »

«

Permitta-me esta illustrada redacção algumas linhas sobre Oeynhausen, a quem tanto maltrata o erudito historiador paulista sr. dr. A. de Toledo Píza, em seus luminosos e parciaes estudos, ultimamente publicados no Commercio de S. Paulo.

O escriptor do Estandarte Caiholico escreve erradamente Oyenhausen; o mesmo fizeram Hercules Florence, em seu Esboço da Viagem do consul Langsdorff, publicado na Revista Trimensal do Instituto Historico do Brasil (1) e seu traductor.

Não admira; quando na propria secretaria do governo de S. Paulo existem cópias officiaes com aquella orthographia viciada. Mais tarde, o visconde de Taunay, em 1895, em um estudo historico que me remetteu sobre esse governador, estudo de summa importancia, destinado ao meu mallogrado S. Paulo Historico, corrigiu o erro e explicou a traducção com grande abundancia de erudição. «Deve ser Gravenberg e não Gravenburg», diz o visconde de Taunay. Entretanto o dr. João Severiano escreve Gravenberg.-Gravenberg é uma povoação perto de Krems, na

Austria.

(1) Eshoço da viagem feita peia sr. de Langsdorfi no interior do Brasil, desde Se. tembro de 1-25 até Março de 129. Fscripto em original francez pelo 2.0 desenhista da commissão scientifica russa Hercules Florence e traduzido por Alfredo de Escragnolle Taray

Vide reales Florence, por Estevam Leão Bourroul, 1 vol. de 759 pags., typ. Anprade Mello & Companhia, S. Paulo, 1901.

Nos bandos e editaes constantes (por cópia) do archivo da secretaria do governo, lê-se ora Grevemburg, com m, ora Grevenburg, com n.

Saint-Hilaire, que viu a assignatura autographa do illustre brigadeiro, attesta ser-Oeynhausen.

« O nome Eynhausen é constantemente citado errado, pondera o Visconde de Taunay em a nota 2, à pag. 54, de seu curioso e attrahente livro sobre A Cidade de Matto-Grosso (antiga Villa Bella), pondo-se o y antes do e, o que impossibilita o diphthongo allemão ay ou melhor öy.»

mado.

Dever-se-ia então escrever Öynhausen, com o grande tre

João Carlos Augusto de Oeynhausen Grevenburg, afilhado da rainha D. Maria, governou o Ceará de 1799 a 1806, e o Matto-Grosso, de cuja capitania tomou posse a 18 de Novembro de 1807, em Villa Bella: governou 11 annos, 1 mez e 21 dias; foi seu oitavo governador.

Fôra habil administrador nas colonias portuguezas, onde grangeou fama, que ainda perdura, bem como em Matto-Grosso, onde «deixou excellente nome, o que não aconteceu com o fatal Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, cuja lembrança ainda hoje é ominosa a todo o Matto-Grosso Matto-Grosso e principalmente á cidade desse nome.»

se

«Oeynhausen, escreve Augusto de Saint Hilaire, de feição germanica, pois era filho de um conde allemão e de uma nhora portugueza de alta gerarchia, tinha educação aprimorada, falava bem francez e mostrava-se homem de sociedade (de bonne compagnie), embora um tanto desleixado no trajar. Fez excellente administração em Matto Grosso.

Todo o contrario fora o marechal de campo Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, valido do conde de Linhares, especie de gigante com uma cabeça redonda em pescoço muito curto, brutal, de máus custumes e casado com uma mulher, com quem vivera muito tempo amancebado.

de uma

Foi tomar conta da sua capitania acompanhado chusma de verdadeiros salteadores, estado maior que no caminho praticou um sem numero de tropelias, tornando-se tambem notavel a mulher pelo espirito de baixa ganancia a mandar vender em Goyaz fazendas. Afinal foi ignominiosamente expulso de Cuyabá quando se proclamou a independencia.» (1)

(1) Vide A. Saint Hilaire, Voyage dans les Provinces de Saint Paul et Sainte Catherine, pags. 278 e 279, tomo I.

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